Por que estamos incertos, ansiosos e sem foco?
As tecnologias atuais nos permitem trabalhar 24 horas por dia de qualquer lugar do mundo, o que significa que temos que decidir, a todo momento, se devemos ou não estar trabalhando. A pandemia do covid-19 aumentou o home-office em todo o planeta, e sobrecarregou o trabalhador com outros afazeres e dilemas próprios de quem trabalha em casa. Enquanto trabalhamos, temos que decidir se respondemos a mensagem de Whatsapp que acabou de chegar, se escrevemos o e-mail com a proposta do projeto que precisa ser enviada ao chefe, se é hora de fazer uma pausa para o café, se devemos botar a roupa para lavar, ou se é melhor fazer aquela ligação pessoal. A lista das responsabilidades, obrigações e coisas por fazer pode ser sentida como infinita e gerar ansiedade. Isto porque de acordo com um estudo de Jordan Peterson, Jacob Hirsh, e Raymond Mar, da universidade de Toronto, a incerteza é experimentada subjetivamente como ansiedade. Até escolher um filme para assistir no Netflix pode ser estressante para muita gente. O psicólogo Barry Schwartz, em seu livro “O paradoxo da escolha: porque menos é mais” explica que a ideia de que somos felizes porque o aumento da quantidade de opções gera liberdade é falsa: quando não temos nenhuma opção para escolher ou quando temos muitas opções nos frustramos e nos sentimos pior. Somente quando temos algumas opções nos tornamos felizes.
Em um trabalho que se tornou mundialmente conhecido como “o experimento da geleia”, os pesquisadores Sheena Ivengar, da Universidade da Colômbia e Mark Lepper, da Universidade de Stanford, organizaram uma promoção de geleia em um supermercado. No primeiro dia, eles colocaram 24 tipos de geleia no estande de degustação, e apenas 6 no segundo dia. No primeiro dia, cerca de 60% das pessoas foram até o estande, no entanto, apenas 3% deles compraram o produto. Já no segundo dia, o estande recebeu apenas 40% de visitas, mas o índice de compra foi muito maior, já que 30% das pessoas compraram a geleia. Os resultados mostraram que quanto menos escolhas nós temos, mais compramos.
As pessoas ficam paralisadas quando há muitas opções, pois receiam arrepender-se da escolha feita, e por isso preferem não escolher. Talvez você já tenha ouvido falar na “fadiga da decisão”, termo cunhado pelo psicólogo social Roy F. Baumeister: muitos experimentos mostraram que ter que tomar decisões continuamente requer esforço e desgasta mental e fisicamente as pessoas, o que quer dizer que tomamos decisões mais impulsivamente à medida em que o dia passa, sendo mais difícil de exercer o autocontrole e combater as tentações. É por isso que os supermercados e grandes lojas de departamento colocam as guloseimas perto do caixa: depois de ter tido o trabalho de selecionar as mercadorias da sua lista de compras, é mais difícil resistir aos doces.
Ter muita coisa para fazer torna mais difícil também manter o foco em uma tarefa. Uma parte do córtex cerebral chamada de orbitofrontal, que como o próprio nome indica está localizada na parte frontal do cérebro e em cima das órbitas oculares, tem uma relação íntima com o comportamento complexo que é o ato de tomar uma decisão e aos comportamentos que realizamos com base nas recompensas ou punições que recebemos. Imagine que você está escrevendo um texto e está sendo mais demorado e difícil do que você imaginava, e você começa a se lembrar as outras coisas que também precisa fazer. O córtex orbitofrontal sinaliza que talvez escrever o texto não seja uma boa meta para perseguir e você fica incerto a respeito. Sinais também são enviados a seu córtex cingulado anterior, outra estrutura relacionada à tomada de decisão cuja hiperatividade resulta em ansiedade. Você então começa a liberar o hormônio noradrenalina, ativando a reação de luta ou fuga e ficando ansioso. A noradrenalina te distrai com outras tarefas ou assuntos que prometem uma recompensa maior do que escrever aquele texto difícil e demorado, e você acaba indo ver o último episódio da sua série favorita.
Soluções
Os estudos de Jordan Peterson e seus colegas apontaram que pessoas altamente religiosas experimentam menos incerteza em suas vidas, e têm uma atividade bastante reduzida do córtex cingulado anterior, muito provavelmente devido ao fato de que elas têm uma explicação sobre o porquê das coisas que limita sua interpretação do mundo. Do mesmo modo, as pessoas desenvolvem valores e metas para restringir os comportamentos: se você tem a ambição de tornar-se engenheiro, precisará dedicar muitos anos ao estudo e à prática, e isso irá por limites a outros comportamentos, de modo que você não ficará livre para viajar pelo mundo. Podemos pensar nessa “limitação” como uma escolha feita antecipadamente. Por exemplo, no estilo de vida minimalista, a escolha feita antes é “não vou comprar nada que não seja essencial”, o que torna fazer compras muito mais fácil e prático. O caso da indumentária já clássica de Steve Jobs, que usava somente calça jeans, camiseta preta e tênis, é emblemático. Também o ex-presidente americano Barack Obama e Mark Zuckerberg usam basicamente a mesma roupa todos os dias para reduzir a tomada de decisões. Obama usava um terno cinza ou um terno azul. Zuckerberg usa uma camiseta cinza, e se inspirou em Jobs. O psicólogo Barry Schwartz afirma que um dos indicadores mais confiáveis de felicidade é a capacidade de manter bons relacionamentos, pois outra forma de limitar nossas escolhas é manter relações estreitas com a família, os amigos e a comunidade onde vivemos – elas limitam as possibilidades de onde moramos, onde trabalhamos, onde circulamos – e isso aumenta nossa felicidade e diminui a incerteza.
O sentimento prazeroso da satisfação atua como um sinal biológico de que você completou uma tarefa corretamente. Se não houvesse esse sentimento, como saber quando parar de fazer algo? A satisfação geralmente é pensada como a introdução de algo – por exemplo, os hormônios grelina, leptina e insulina afetam sua fome, e você satisfaz a fome com comida. Também há satisfação em terminar as tarefas que ficaram incompletas, liberando o hormônio e neurotransmissor serotonina, que atua na redução da ansiedade. Temos sempre como background mental as tarefas incompletas, e para que a ansiedade relacionada a elas diminua, é necessário emitir um comportamento físico. Quando procrastinamos (pense em quando você fica surfando no YouTube ao invés de ler o capítulo do livro para a aula da pós-graduação de amanhã, por exemplo), a ansiedade continua a atacar, a não ser que você faça algo a respeito. Roy F. Baumeister e E. J. Masicampo, da Florida State University, publicaram um estudo demonstrando que tarefas incompletas geram pensamentos intrusivos enquanto a pessoa faz outra coisa. Mas, ao permitir que os participantes formulassem planos específicos para as metas incompletas, os pensamentos foram eliminados. O ato simples de fazer planos, de fisicamente escrever no papel o que, como e onde você vai realizar as tarefas é gratificante o suficiente para que o cérebro diminua os sinais de ansiedade, resolvendo a incerteza relacionada às tarefas. Portanto, a organização é um importante aliado na hora de reduzir as incertezas e a ansiedade, e também muito valorizada pelos empregadores como uma soft skill no mercado de trabalho.
10 dicas para reduzir a fadiga da decisão
- Planeje todas as suas reuniões ou compromissos de trabalho pela manhã, quando sua acuidade está mais alta. Elimine os encontros profissionais na parte da tarde e da noite. Estudos mostram que as pessoas tomam decisões mais sólidas e justas no início do dia.
- Aproveite o fim de semana com projetos pessoais. Chega dessa teoria de que não existe separação entre o trabalho e a vida pessoal. Você não estará biologicamente preparado para manter o equilíbrio em seu processo de tomada de decisões sem descanso adequado e estímulo adequados fora do seu ambiente de trabalho.
- Antes de tomar uma decisão importante, faça uma pausa de 15 minutos fora do ambiente em que você trabalha e de preferência em contato com a natureza, isto traz a renovação necessária para ser mais ponderado.
- Se você precisar trabalhar no final de semana, reserve entre uma e duas horas, no máximo, para se preparar para a semana seguinte. Muitas pessoas gostam da ideia de se organizar no domingo à noite. Isso é uma forma de reduzir a fadiga na segunda-feira.
- Aproveite o final de semana para organizar a rotina da casa, seja fazendo a limpeza e lavando as roupas, seja montando o cardápio ou cozinhando as porções da semana, ou ainda deixando as compras de supermercado prontas.
- Mantenha uma rotina nas tarefas domésticas, mantendo o guarda-roupa organizado e mais enxuto, reduzindo a quantidade de coisas espalhadas pela casa, organizando armários da sala e cozinha, deixando a chave sempre no mesmo lugar, as roupas de cama e mesa dobradas nas gavetas. Automatize sua rotina o máximo que puder para poupar a si mesmo de escolher coisas irrelevantes.
- Decida as roupas que você vai usar na noite anterior – o que inclui sapatos e acessórios.
- Estabeleça um alarme no seu calendário que o lembre de ir à academia, caminhada, pilates ou outras formas de exercícios. O importante é manter o compromisso. O exercício libera endorfinas que produzem prazer e diminuem a ansiedade.
- Mantenha seus níveis de glicose elevados para conservar seu cérebro carregado – faça lanches saudáveis em vez de comer um doce ou tomar um café triplo.
- Reserve tempo para dormir bem. Sem sono adequado seu corpo fica ainda mais vulnerável ao estresse e à ansiedade.
Tarsia Paula Piovesan Farias
CRP-12/17900
contato@optioop.com.br
(48) 99932 1560